Apesar das faltas de respostas de Laís, Serena manda todos os dias sua mensagem de bom dia. Durante um bom tempo, ela segue acreditando que em algum momento terá uma resposta. Com o passar dos dias, sua tristeza cresce com a total mudez de Laís.
Numa manhã está no escritório com a tela do computador aberta numa planilha há horas. Marta vai chamar a filha para almoçar e a vê parada, olhando para o nada.
- Filha vem almoçar!
Serena leva um susto que a faz sair do emaranhado que se tornou seus pensamentos.
- Ah mãe, me desculpa, tava vendo uma planilha de custos.
- Serena já entrei aqui três vezes na última hora. Você estava com esse olhar perdido e imóvel! Que foi?
- Nada não mãe, preocupação normal do trabalho.
- Filha a loja tá indo bem, graças a Deus não temos dívidas. Essa preocupação não tem nada a ver com a loja.
Serena fica sem graça pela perspicácia de sua mãe, mas não se sente a vontade para conversar com ela.
- Tá tudo bem mãe.
- Vejo seu olhar triste, vai querer negar?
- Bobagem mãe, sério. – a expressão de Serena fica triste, mesmo tentando sorrir.
- Esse sorriso torto aí? Me diz Serena, quem é ela?
Serena engasga, tenta mudar de assunto e inventa que é um problema de uma amiga, está tentando ajudar sem sucesso.
- Sei problema de amiga... tá bom filha. Quando você quiser, pode conversar comigo. – e volta para a loja.
Serena se sente grata por sua mãe entender sua condição sexual e nunca ter criado qualquer constrangimento. Mesmo assim, não consegue se abrir sobre Laís. Imagina que sua mãe implicaria pelo fato de ambas serem tão diferentes, viverem em mundos tão opostos.
Depois do almoço, Marta diz com carinho e preocupação:
- Serena vai pra casa, você tá precisando descansar!
- Vou fazer isso mãe. – Dá um beijo, pega sua bicicleta e sai da loja.
Apesar de chateada não quer ir para casa, fica andando pelo centro sem destino. Decide ir ao parque perto da sua casa. Senta perto de uma árvore que fica próxima a entrada, e deixa seus pensamentos voarem.
Não percebe quando uma mulher muito bonita se aproxima e senta no banco perto dela. A mulher fica olhando para Serena, percebe a expressão triste e resolve se aproximar.
- Olá, aceita um bombom?
Serena desperta dos seus pensamentos e olha para a mulher.
- Ah...obrigada... – e pega um bombom.
A mulher se senta ao lado de Serena e diz num tom tranquilo.
- Hoje a manhã foi tensa, vim aqui para relaxar um pouco.
- Aqui é bom pra isso. – Serena fica olhando para ela e o seu tom de voz e seu jeito simpático, lhe agradam.
- Aí reparei em você, quietinha e com um olhar triste, longe. Me perguntei: o que poderia deixar uma menina linda com essa expressão que não combina em nada com ela?
- Ah.... coisas do coração....
- Sabe, às vezes é bom desabafar com alguém, quem sabe posso te ajudar.
- Eu nem sei seu nome!
- Ah que falta de educação a minha! Meu nome é Luísa e o seu? – e dá seu sorriso encantador.
- Me chamo Serena.
- Nome suave e doce, gostei!
Serena sorri.
- Ei que bom, te fiz sorrir! E confesso que você fica ainda mais bonita sorrindo! – Luísa também sorri.
- Por acaso está me cantando?
- Não, não mesmo. Apesar de te achar linda, prefiro mulheres da minha idade.
-É pelo visto não faço o menor sucesso com mulheres mais velhas mesmo. – o tom de Serena volta a ficar triste.
- Então uma mulher má é a responsável por esse olhar tão triste?
- É sim. – sem entender porque, Serena se sente confortável com Luísa.
- Bom temos algumas alternativas, mas preciso entender a história.
- É uma cliente da loja que trabalho. No primeiro dia que eu a vi, senti uns trecos sabe?
- Hum você foi pega pelo famoso amor à primeira vista.
- É foi bem isso.
- E ela te notou?
- Sim, na verdade tivemos dois ótimos encontros depois.
- E?
- No segundo ela ficou estranha, sei lá. Estava tudo bem, ficamos deitadas juntinhas, do nada ela se levantou e deu uma desculpa. Foi embora.
- Mas aconteceu algo?
- Nada. Ela parecia assustada sabe?
- É sei sim, já aconteceu comigo. Inclusive recentemente. Mas vocês mantém contato?
- Nos três primeiros dias liguei, ela não atendeu nenhuma vez. Tem quase um mês que todos os dias de manhã eu mando mensagem, coisas fofas, nada de pressão ou questionando sabe?
- Sim, só está tentando se reaproximar numa boa dela.
- Exatamente! Só que ela não me respondeu nem uma única vez. Tô perdida porque as duas vezes que ficamos juntas, deu para perceber que ela curtiu sabe?
Luísa fica olhando para o rosto angelical e pensa como as pessoas podem ser mal interpretadas e saírem machucadas pela falta de sensibilidade do outro.
- Sabe Serena, tem mulheres que por alguma razão, se fecham e se armam. Tem medo de se entregar a algo novo, e quando percebem que existe esse risco, recuam.
- Nossa, mas eu fui tão verdadeira, não pressionei em nada. Apenas deixei claro que queria mais do que sexo.
- Tem gente que se apavora com a simples possibilidade de existir algo além do sexo.
- Que gente boba!
- Concordo com você Serena. Eu a pouco tempo passei por isso. Mas acho que não me apaixonei como você ou é apenas sinal que estou mais velha, digo madura. – solta uma gargalhada espontânea que faz Serena rir também.
- E no alto da sua maturidade, o que me aconselha?
Luísa pensa um pouco, e pergunta:
- Vocês não se conhecem bem, foram só três encontros certo?
- Sim, mas foi tão intenso ao menos pra mim sabe?
- Sei sim. Olha se eu fosse você, depois de um mês se fazendo presente e ela nem ao menos se dignar a responder uma única mensagem, por mais que doesse, me afastaria. Sabe qual o melhor amor Serena?
- O correspondido??
- Não linda, o amor próprio! Você tem dado seu tempo e sua atenção e ela devolveu com um frio “tanto faz”, não é um sinal de que você foi até onde podia e que agora, se for para algo acontecer, que parta dela?
Apesar de sentir uma onda de tristeza, percebe que Luísa tem razão.
- Sim....uma pena porque eu acho que poderia ser tão bonito...
- Mas ela ainda não percebeu. Talvez se você aceitar o tanto faz dela e se afastar, ela perceba que você faz falta e decida ir até você.
- Você tem razão, preciso entender que o que eu acho e sinto não é igual pra ela. Talvez ela não esteja na mesma vibração. Fiz e demonstrei como pude, ela só não quis ver. – o tom triste ainda se faz presente, mas agora tem uma nota de decisão.
- Pode ser que ela apenas não consiga ver por medo, não fique com raiva dela, não ainda. Dê tempo e distância para ela.
- E tem um prazo? – Serena consegue dar um sorriso suave.
- Tempo nesses casos é muito relativo Serena. Siga sua intuição.
As duas ficam em silêncio sentadas lado a lado. Luísa é quem quebra o silêncio.
- Bom moça, preciso ir. Espero ter te ajudado um pouquinho.
- Obrigada de verdade, precisava desabafar e não tinha com quem.
As duas se levantam, Serena dá um beijo e um abraço em Luísa.
- Opa! Acho que agora arrumou uma amiga! – Luísa corresponde e sorri.
- Me ajudou e muito, de verdade espero ser sua amiga!
- Então vamos fazer assim, vou te dar meu telefone e a gente conversa. Quem sabe marcamos um encontro para podermos criar um plano infalível para você conquistar a Elsa!
- Elsa???
- É! Não assistiu Frozen??
Serena solta uma gargalhada e diz:
- Nossa um apelido perfeito pra ela!!
Elas trocam seus números e se despendem com a promessa de fazer essa nova amizade florescer.
Serena apesar de ainda triste, se sente mais leve depois da agradável conversa com Luísa. Decide pôr em prática os conselhos que recebeu.